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04/05/2018

TJ-SP autoriza penhora de insumos de companhia em recuperação judicial

Uma empresa em recuperação judicial pode ter a sua matéria-prima penhorada ou alienada mesmo antes de se esgotar o chamado período de blindagem – prazo de 180 dias, contados do início do processo de recuperação, em que ficam suspensas as ações de cobrança dos credores. Esse foi o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) ao determinar que a Abengoa Bioenergia Brasil entregue parte da sua produção de cana-de-açúcar como pagamento de uma dívida de mais de R$ 15 milhões.

A ação de cobrança foi movida pelo fundo americano Amerra Capital Management, que não participa do processo de recuperação da Abengoa. O contrato firmado entre eles têm cláusula de alienação fiduciária. Nessa modalidade, o devedor transfere a propriedade dos seus bens para o credor como garantia do pagamento e tais bens só voltam para o seu nome depois de a dívida estar totalmente quitada.

A Lei de Recuperação Judicial e Falências (nº 11.101, de 2005) exclui credores com esse tipo de garantia dos processos. Ou seja, eles não participam do plano de pagamento aos demais credores da empresa e também não estão sujeitos aos 180 dias de blindagem. Há exceção, no entanto, quando o bem dado em garantia é considerado como bem de capital essencial à atividade da companhia.

Consta no artigo 49 que, nesses casos, os bens não poderão ser retirados dos estabelecimentos. Esse é um argumento comumente usado pelas empresas para barrar a penhora ou a alienação de seus produtos, imóveis e equipamentos oferecidos para garantir empréstimos com bancos e fundos de investimentos – os principais detentores das garantias fiduciárias.

No processo da Abengoa, por exemplo, a justificativa é a de que a cana-de-açúcar é a sua principal matéria-prima e que sem ela não há atividade empresarial. A penhora do produto representa “grande risco ao sucesso do processo recuperatório”.

A discussão envolve a safra atual, que começa a ser colhida em junho. A Abengoa deu cerca de 520 mil toneladas de cana e de açúcar em garantia ao empréstimo com o fundo americano, o que representa 13% do total da sua produção.

A 2ª Câmara de Direito Empresarial do TJ-SP, que analisou o caso, não discutiu apenas a essencialidade do bem à atividade da empresa – como geralmente ocorre nos julgamentos sobre esse tema. O que pesou na decisão, desta vez, é se o bem em discussão poderia ou não ser considerado como bem de capital.

E, para eles, a matéria-prima não pode ser considerada. Por esse motivo, não está contemplada pelo artigo 49 da lei e, sendo assim, não haveria impedimento à execução contra a Abengoa – mesmo durante o período de 180 dias de blindagem. A situação, ainda segundo os desembargadores, é diferente dos casos em que há imóveis ou maquinário envolvido e que, se retirados das empresas, podem paralisar as atividades.

O relator, desembargador José Araldo da Costa Telles, levou em conta, no seu voto, o fato de que a Abengoa enfrentará dificuldades com a retirada da matéria-prima, mas ponderou que há alternativa para manter a atividade. “O mercado pode oferecer produto similar, ainda que mais distante e por preço diferenciado”, afirmou.

Ele acrescentou ainda que ao oferecer os bens como garantia, essa questão deveria ter sido considerada pela empresa. O entendimento foi seguido pelos demais desembargadores (processo nº 2012974-11.2018.8.26.0000).

Essa decisão, segundo especialistas, é “um banho de água fria” para as empresas que atuam no agronegócio. Especialmente porque, na maioria dos casos, a matéria-prima que produzem corresponde a mais da metade da riqueza gerada.

Para os credores, por outro lado, traz alívio. Especiaslit, diz que, na maioria das vezes, além de negar a retirada dos bens, os juízes deixavam os credores sem respostas. “Não falam por quanto tempo o bem não pode ser retirado, nem como o credor vai ser pago.”

Ele entende que, nesse caso da Abengoa, a decisão deveria ser mantida – em favor da execução – mesmo se a análise dos desembargadores ficasse restrita à essencialidade dos bens para a companhia. Para o especialista, aquilo que se produz para vender, como a cana-de-açúcar, não pode ser considerado como essencial.

“É diferente de uma máquina, por exemplo, que transforma a cana-de-açúcar em álcool ou em açúcar. É um maquinário pesado, caro e de difícil remoção. Se tirar da usina, ela para”, diz.

Especialista na área acredita que, apesar de a matéria-prima não ser considerada como bem de capital essencial, os tribunais devem reconsiderar a permissão para a penhora nos casos em que a execução envolve 100% dos produtos utilizados pela empresa. “Porque o princípio que rege a recuperação é o princípio da preservação da empresa. O juiz sempre vai pensar no macro e não no interesse de um credor isolado”, entende.

Para a especialista, em uma situação como essa, os tribunais tenderiam a uma solução intermediária – algo que não prejudicasse os demais credores e que não gerasse risco de falência à empresa em recuperação.

Ela diz, por outro lado, que percebe uma tendência do Judiciário em valorizar a alienação fiduciária. Já existem decisões, por exemplo, permitindo a execução – também durante o período de blindagem – de recebíveis e fluxo de caixa de empresas em recuperação judicial.

Uma delas foi julgada pela 1ª Câmara de Direito Empresarial do TJ-SP (processo nº 2273783-85.2015.8.26.0000). A companhia em recuperação alegava que não conseguiria arcar com os salários dos funcionários se a execução fosse adiante. Para os desembargadores, porém, mesmo que imprescindível para o desenvolvimento da empresa, o crédito cedido fiduciariamente não poderia ser considerado como bem de capital.

“Compreendo perfeitamente a difícil situação financeira da empresa, mas o suprimento de necessidades prementes de capital para pagamento de salários não pode ser feito mediante o esvaziamento dos direitos creditórios objeto de garantia fiduciária”, afirmou, na ocasião, o relator do caso, desembargador Francisco Loureiro.

Por Joice Bacelo | De São Paulo

Fonte : Valor

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